Ciclos
Tenho muita sorte com todo o meu ciclo.
São poucos dias de um fluxo pouco intenso que não me atrapalha em nada. Nenhuma dor, nenhuma cólica, nenhum tipo de desconforto, sintomas muito brandos de tpm.
Até faço um controle das datas no calendário, mas meu relógio mesmo: é a piscina.
Tem um determinado dia do mês em que entro na água, começo a nadar, e as coisas simplesmente não acontecem. Nado patinando, fazendo uma força que não surte qualquer efeito, os tempos são ridículos. A sensação é de ter desaprendido tudo.
Não tem erro, um ou dois dias depois: estou menstruada.
Acontece igual todo mês. O que não quer dizer que eu lide bem com a coisa toda. Todo mês eu me me frustro, todo mês detesto esse dia com toda a irritação à flor da pele que ele traz.
*
Já bati muito a cabeça com o professor a respeito. Foram alguns meses repetindo a mesma discussão, em vão.
E essa foi uma briga que não ganhei na saliva. Cansada de me desgastar tentando argumentar com alguém que nunca vai poder entender a situação de fato, simplesmente parei de falar. Esperei ele ver. Até que viu.
— O que tu tem? Tu não tá legal hoje.
— Olha, posso até te falar o que é, mas tu vai dizer que não acontece…
— Tá bom… O que tu sente? O que muda?
— Na verdade, pra mim, o pior não são nem os dias do fluxo em si, é a véspera. É hoje. Depois que vem, estabiliza de novo. Mas aí é isso, tudo fica muito mais difícil, parece que não consigo mais nadar.
— Tudo bem. Só não te entrega! Não deixa isso te impedir de tentar.
E desde então não discutimos mais. Esse mês, o dia da véspera foi especialmente tenebroso. Ele notou que eu não tava bem antes mesmo de começar a nadar. Adaptou o treino. Não precisei nem falar nada.
Pequenas vitórias.
*
Mas o homem tem um argumento difícil de refutar: não tem como escolher dia de prova.
E aí?
Não seria melhor saber lidar com o esforço mesmo nesse período, já que não tenho como prever em que fase do meu ciclo uma prova pode cair — e não pretendo mais interromper a menstruação por outros meios?
Nesse ponto, não discordamos.
Claro, é diferente para cada mulher. Tenho amigas pra quem só o fluxo pode ocupar quase um terço do mês ou que sentem tanta dor que realmente não conseguem fazer nada.
No meu caso, os maiores incômodos são ficar irritada, com o corpo inchado e perder força na água. Só. O que me faz pensar no quanto, às vezes, não tendemos a usar esse período como desculpa só porque essa narrativa já existe.
Seria muito fácil eu me acomodar. Daí a importância de ter alguém cobrando do outro lado.
Se tem cobrança é porque tem potencial.
*
Aqui, entre a “véspera” e o início do fluxo em si, normalmente passam um ou dois dias de chove-não-molha. Fico ainda mais irritada e ansiosa: querida, não podia vir de uma vez pra gente acabar logo com isso?
Não, não podia.
Tem coisas que ainda fogem do nosso controle.
Não é surpresa, é igual todos os meses. Mês que vem, vou me irritar exatamente do mesmo jeito com as mesmas coisas de novo.
A questão é que, mesmo entre mulheres, entre mulheres que treinam, entre pessoas que menstruam, esse não é um assunto que surge com frequência. Às vezes, ainda parece um tabu, mesmo entre nós. Quando lancei nos stories essa semana, uma amiga e colega de treino respondeu:
Nenhuma experiência é única.
Às vezes a gente só esquece de compartilhar.
Todo mês
~ Dosando os treinos ao longo do ciclo
~ “Não posso, tô menstruada.” Será?
~ Manter a constância na atividade física é um privilégio
~ Olimpíadas 2024: pela primeira vez, as mulheres são 50% dos atletas
~ Toda a minha torcida pra atleta que mais me orgulho de admirar e dividir a terrinha: Vivi Jungblut
Aqui estou a caminho da menopausa e a menstruação fica meses sem vir. Só que esse momento “pré” ainda acontece, mesmo eu não menstruando. É esquisitíssimo. Uma tpm - tensão pré-menopausa - indo e vindo de quem só viveu muita tpm reconhece. Mas o louco é que apazigua e nada acontece.
Menstruação deveria ser questão de saúde pública, do serviço social, enfim... Ainda bem que de vez em quando a gte lembra de conversar né? Beijo